As agências financiadoras e os parceiros de implementação apoiam o governo de Moçambique a fortalecer a logística de saúde do país, interligando o DHIS2 e outros sistemas de gestão electrónica da cadeia de abastecimento.
Ao longo das últimas décadas, foram feitos progressos significativos na busca de soluções para alguns dos desafios que assolam os cuidados de saúde em África. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), a mortalidade infantil na região diminuiu continuamente nos últimos 20 anos, de cerca de 80 por 1.000 nascidos vivos em 2000, para 40 por 1.000 em 2020. Da mesma forma, a expectativa de vida no mesmo período aumentou de 53 anos a 64 anos. Apesar desses ganhos, a África ainda carrega uma carga de doenças desproporcionalmente maior do que o resto do mundo. As condições neonatais e as doenças infecciosas imunopreviníveis ainda constituem os maiores problemas de saúde para a maioria dos países da região. Isso se deve, entre outros factores, a sistemas de logística de saúde inadequados, que dificultam a garantia de vacinas, tratamentos e suprimentos médicos que chegam às populações que deles necessitam.
Em Moçambique, algumas unidades sanitárias estão a relatar cobertura de vacinação superior a 100%, mesmo quando o estoque de vacinas para a unidade ainda não está esgotado. Além disso, algumas unidades sanitárias têm estoque de vacinas em excesso, mais do que o necessário, enquanto outras não têm o suficiente para atender às suas demandas devido a mecanismos de decisão logística ineficazes. O fortalecimento dos sistemas da cadeia de suprimentos, aproveitando as tecnologias modernas, incluindo o DHIS2, resolveria esses problemas e facilitaria o acesso equitativo a vacinas, medicamentos e outros artigos.
Em resposta a estes desafios, o Ministério da Saúde de Moçambique (MISAU) fez parceria com organizações como o Fundo Global, USAID, GAVI e Saudigitus (HISP Moçambique) para implementar soluções electrónicas inovadoras para a gestão da cadeia de abastecimento através da integração do DHIS2 com outras fontes de dados e ferramentas. Estes incluem o OpenLMIS, que foi implementado para gestão de estoque específico de vacinas como parte do Programa Alargado de Vacinação (PAV), o Lista das Principais Unidades Sanitárias (Master Facility List – MFL) que faz parte do Sistema de Gestão de Informação de Saúde, SISMA, baseado em DHIS2 e a Lista dos Principais Produtos (Master Product List – MPL) construído em uma plataforma personalizada chamada Ferramenta Central (FC). Os sistemas de logística de saúde interconectados resultantes são adaptados ao ambiente local para facilitar a gestão eficaz da logística de saúde, fornecendo dados confiáveis de gestão de estoque de medicamentos, vacinas e outros produtos médicos, bem como analisando dados de saúde e logística para melhores relatórios e planeamento. Para isso, a Saudigitus aproveitou as capacidades de interoperabilidade do DHIS2, bem como sua experiência no desenvolvimento da camada de interoperabilidade SISMA, para expandir a plataforma Sistema de Gestão de Informação de Saúde nacional, integrando os dados logísticos do MISAU e os da FC.
A Evolução das Estruturas da Cadeia de Fornecimento de Saúde em Moçambique
Os sistemas de logística para cuidados de saúde são cadeias intrincadas de processos pelos quais medicamentos e consumíveis médicos são entregues de seus fabricantes às unidades de saúde onde são necessários. Para serem eficazes, esses sistemas devem ser bem coordenados para garantir que as mercadorias sensíveis à temperatura sejam armazenadas em ambientes controlados em toda a cadeia e que todos os suprimentos sejam entregues em tempo útil para evitar rupturas ou que expire o prazo da sua validade.
Moçambique é um grande país no sudeste da África, abrangendo 309.500 milhas quadradas e abriga cerca de 30 milhões de pessoas. Com infraestrutura limitada de transporte e armazenamento, a saúde do país foi prejudicada por sistemas ineficazes de cadeia de suprimentos de medicamentos, vacinas e consumíveis médicos, especialmente a entrega nas unidades sanitárias distantes e em locais remotos. Antes de 2014, todos os produtos de saúde destinados às unidades sanitárias públicas do país eram armazenados em três Armazéns Médicos Centrais (CMAM). Isso representou desafios logísticos significativos para abastecer medicamentos às unidades sanitárias remotas face à infraestrutura de transporte limitada, especialmente quando surgiu a necessidade de medicamentos e consumíveis que salvam vidas a serem entregues com urgência. Consequentemente, a necessidade de construir sistemas descentralizados de cadeia de suprimentos para o país tornou-se essencial para mitigar esses desafios.
Em 2013, o governo de Moçambique desenvolveu um Plano Estratégico do Sector da Saúde 2014-2019, um documento de política que orientaria o MISAU a implementar medidas para melhorar o Sistema Nacional de Saúde (SNS) abordando as lacunas identificadas. Entre outras medidas a serem tomadas, o documento de política identificou a necessidade de descentralizar a cadeia de suprimentos de saúde e adoptar tecnologias modernas. Em parceria com a USAID, PNUD, GAVI e outras agências doadoras, o governo de Moçambique construiu, desde 2014, armazéns regionais para aproximar a cadeia de abastecimento das unidades sanitárias em todo o país. Os suprimentos desses armazéns são requisitados a nível provincial e distribuídos aos distritos trimestralmente. Para melhorar ainda mais a gestão da cadeia de abastecimento de Moçambique, DHIS2, FC, OpenLMIS e outros sistemas de software foram adoptados para aprimorar a função do sistema de logística de saúde pública do país por meio da digitalização, interoperabilidade e relatórios em tempo real.
Os avanços impressionantes feitos pelo MISAU desde 2014 para melhorar a cadeia de abastecimento de saúde em Moçambique foram facilitados pela boa colaboração com parceiros, incluindo Chemonics e VillageReach. Estes parceiros, financiados pela USAID e pela GAVI, respectivamente, trabalharam com o governo de Moçambique a diferentes níveis, para fortalecer o CMAM, aprimorando a gestão de aquisições, rastreamento de estoque e relatórios precisos. Ambos parceiros de implementação também colaboram com a Saudigitus para expandir a camada de interoperabilidade do SISMA por meio de integrações de interface de programação de aplicações (application programming interface – API).
Fortalecendo a gestão distribuída da cadeia de suprimentos por meio da integração
A partir de 2015, a USAID, através do projecto Global Health Supply Chain – Procurement and Supply Management (GHSC-PSM), apoiou o CMAM, as Direcções Provinciais de Saúde (DPS) e o Departamento Central de Laboratório (DCL) para melhorar a logística e os sistemas da cadeia de abastecimento, com o objectivo de garantir a disponibilidade regular de medicamentos e produtos básicos de alta qualidade e baixo custo nas unidades sanitárias. Para atingir esse objectivo, a USAID contratou a Chemonics para interconectar o DHIS2 com plataformas de logística e fontes de dados existentes e novas. Consequentemente, a Chemonics desenvolveu uma plataforma personalizada chamada Ferramenta Central (FC), um repositório de dados de nível superior e uma ferramenta de integração usada para coletar e armazenar informações logísticas multiplataforma relacionadas a vários programas de saúde, incluindo HIV, TB, Malária e Nutrição em Moçambique.
Antes da implementação da FC, as bases de dados para rastreamento de produtos eram desarticulados e sem procedimentos padronizados para validação da qualidade dos dados. Com a FC, os dados passam a ser importados directamente de qualquer uma das diversas bases de dados que armazenam os dados logísticos dos diversos programas de saúde e reproduzidos em outros sistemas. Durante esse processo, a FC realiza avaliações de qualidade de dados para detectar inconsistências ou anormalidades que podem ser corrigidas na base de dados de origem antes que os dados sejam compartilhados com outros sistemas. Desde a sua adopção, a FC facilitou um aumento na taxa de requisição, melhorando assim a coleta de dados usados na previsão e planeamento da cadeia de suprimentos. A FC também reduziu o tempo médio necessário para preparar um plano de distribuição de medicamentos, vacinas e consumíveis de 15 dias para cerca de 5 minutos.
Mecanismos operacionais do sistema integrado da cadeia de suprimentos
A Ferramenta Central está no centro do sistema integrado da cadeia de suprimentos, facilitando a troca de dados entre as plataformas e ferramentas que compõem o sistema. Quando uma produto é adicionado a FC, o registo desse produto é enviado para o MPL e a unidade HMIS relevante no MISAU é notificada de uma mudança pendente nos níveis de estoque por meio de um aplicativo que serve como um sistema de monitoramento dentro da camada de interoperabilidade do SISMA. Depois que a entrada é revista, o produto é adicionado ao grupo apropriado no MPL, tornando-o acessível ao programa ou unidade sanitária correcta, conforme indicado no MFL. Os dados agregados desse sistema integrado, como número de pacientes, medicamentos e produtos fornecidos, são disponibilizados no DHIS2, que serve como repositório de dados e SISMA. Isso auxilia o planeamento logístico nos níveis nacional e subnacional, apoiando os esforços para a disponibilidade a longo prazo de medicamentos e produtos básicos nas unidades sanitárias.
Os dados de logística de vacinação são extraídos do OpenLMIS implementado para rastreamento e inventário de produtos e medicamentos no CMAM. Isto é através de uma iniciativa da GAVI que financiou a implementação do OpenLMIS para gestão de dados do PAV em Moçambique. O sistema PAV OpenLMIS, conhecido em Moçambique como Sistema Electrónico de Logística de Vacinas (SELV), foi desenvolvido pela VillageReach para o planeamento da distribuição de vacinas. Usando o SELV, os dados de estoque são inseridos no OpenLMIS e posteriormente mapeados para o MFL no DHIS2, validados pela FC e transferidos para o repositório por meio da API do DHIS2, tornando assim os dados essenciais de vacinação prontamente disponíveis ao nível nacional.
Além disso, a Saudigitus está actualmente trabalhando com a VillageReach para desenvolver um Registo Electrônico de Vacinação baseado no Tracker para toda a vacinação de rotina. Quando concluído, será facilmente integrado ao sistema Tracker existente, usado para registar a campanha de vacinação em massa da COVID-19 em curso. Esta iniciativa está em concordância com o plano de Moçambique para fazer a transição dos actuais esforços de vacinação COVID-19 de uma campanha em massa para uma vacinação de rotina e irá culminar na criação do registo unificado de vacinação para o país, que seja prontamente interoperável com o SISMA e outras plataformas de programas para uma melhor análise. Ter dados de estoque de vacinas no DHIS2 também ajudaria a facilitar a gestão mais eficaz dos programas de vacinação de rotina, aproveitando os seus recursos para gerar relatórios necessários detalhados.
Limitações e desafios actuais
Neste momento, o planeamento logístico baseado em FC não está em tempo real porque os dados coletados nos níveis inferiores são revistos ao nível central antes que as decisões de fornecimento sejam tomadas. Além disso, os processos de validação e limpeza de dados levam de 1 a 2 meses. Como os produtos são fornecidos às unidades sanitárias trimestralmente, esse rítmo de coleta e processamento não apresenta, por si só, um problema de logística no modelo de distribuição actual, embora resulte em atrazos na geração de relatórios mensais precisos.
Outras restrições da integração OpenLMIS-DHIS2 incluem a falta de um sistema electrônico de captura de dados para OpenLMIS ao nível da unidade sanitária e a indisponibilidade de dados analíticos ao nível do distrito e da unidade sanitária. O último problema está sendo resolvido nos esforços contínuos para actualizar o MFL e agilizar os processos de limpeza e validação dos dados no OpenLMIS. Para o primeiro, a Saudigitus e seus parceiros estão a avaliar várias soluções para permitir a captura de dados de estoque ao nível da unidade sanitária, incluindo o uso de DHIS2 como um LMIS de usuário final por meio do qual os profissionais de saúde ao nível da unidade sanitária podem capturar dados básicos de estoque com o aplicativo DHIS2 Android, utilizando os mesmos dispositivos móveis já em uso para coleta de dados do programa de saúde no DHIS2. Enquanto aguarda-se a resolução desta questão, Moçambique continua a utilizar a SMT, a Ferramenta de Gestão de Estoque, baseada em Excel suportada pelo UNICEF, em paralelo ao OpenLMIS para coletar e analisar dados de estoque.
Planos futuros para uma cadeia de abastecimento de saúde eficiente em Moçambique alavancando o DHIS2
Embora o sistema integrado de logística de saúde ainda esteja em desenvolvimento e o rítmo tenha sido afectado pelo surto da COVID-19, foram alcançados benefícios significativos para o sistema de saúde em Moçambique. Mais facilidade de rastreamento de dados do nível de estoque de medicamentos e produtos; a ligação de dados logísticos ao MFL e a comunicação mais fácil de dados logísticos essenciais ao MISAU e aos parceiros de financiamento melhoraram significativamente.
A Saudigitus continua a trabalhar com o governo de Moçambique, doadores e parceiros de implementação no planeamento e implementação de melhorias adicionais no sistema nacional de logística de saúde, incluindo o apoio ao uso de dados de produtos no DHIS2 pelas equipas da Malária, Tuberculose, HIV e Nutrição, e desenvolver um Registo Electrónico de Vacinação baseado no DHIS2, que – quando integrado com o sistema da cadeia de abastecimento – ajudará o MISAU a monitorizar e gerir os programas de vacinação de rotina de forma mais eficaz.